Possui uma paisagem contrastante – entre o belo e feio. Foi palco de competições durante o período dos Jogos Olímpicos – Rio 2016, mesmo contra a vontade de muitos. É constantemente centro das atenções toda vez que o assunto é poluição e vontade política. Além disso, é objeto de calorosos debates sobre o tema saneamento. Sim, a Baía de Guanabara é a menina dos olhos do Rio de Janeiro e também fonte de preocupação para governo e população.
A Baía de Guanabara recebe 481 toneladas de DBO/dia , ou seja, total de carga orgânica gerada por dia pelos 15 (quinze) municípios ao redor da Baía de Guanabara. Esta também sofre, ocasionalmente, com o despejo de óleo de embarcações ou poluentes industriais. Este cenário crítico para os que o veem mais de perto e diariamente precisam conviver com a grande quantidade de lixo, maus odores, doenças e vetores, por vezes, esteve a ponto de ser findado, porém no final das contas, só o que parece ter diminuído foi a esperança de uma Baía limpa e cuidada.
Segundo o Professor, Engenheiro e Mestre em Engenharia Ambiental, Ernani de Souza Costa, se de fato houvesse vontade, a Baía de Guanabara poderia ser despoluída em 10 a 15 anos, pois na verdade não existe incapacidade técnica, nem inviabilidade econômica, o que é necessário é a vontade política em fazer.
Confira a seguir a entrevista exclusiva com o Presidente da Conen Infraestrutura Urbana, o Engenheiro Civil e Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC, Ernani de Souza Costa.
1 – As tentativas de despoluição da Baía de Guanabara começaram na década de 90, com o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), mas este não teve muito êxito e foi extinto em 2006. Qual foi a falha do programa?
Eu não concordo com a afirmativa de “não lograr êxito”, ao início do plano nossa ação em saneamento era incipiente. Veja Saneamento significa Distribuição de Água, Esgoto Sanitário, Resíduos Sólidos, Drenagem, controle de vetores e outras ações parcelares complementativas de um todo.
Tínhamos duas ETEs: Penha e Ilha do Governador, nenhum emissário. O progresso foi enorme!
O PDBG foi um programa muito complexo que atingiu diversos braços do saneamento; desde a educação ambiental, passando pela coleta e tratamento de resíduos sólidos, até o abastecimento de água para dar sustentabilidade ao programa e também a coleta e tratamento do esgoto sanitário. O programa se desenvolveu na verdade com os seguintes passos:
- Início da Década de 80: Projeto Rio / Ministro Andreazza
- 1987: Projeto de Recuperação Gradual do Ecossistema da Baía de Guanabara
- 1991: “The on Recuperation of the Guanabara Bay Acosystem” / JICA, visando a recuperação dos ecossistemas da Baía de Guanabara
- 1995: Programa de Despoluição da Baía de Guanabara
2 – Durante o PDBG houve redução significativa de poluição ?
Sim, durante o período de vigência do PDBG houve uma redução gradativa dos valores de poluição proveniente do esgoto sanitário, mas onde não teve êxito foi na coleta dos resíduos sólidos (e essa foi muito grave), pois não avançou em nada. O programa também deixou a desejar no tocante a recuperação dos manguezais ao longo da Baía (tema pertencente a outro programa dentro do PDBG).
3 – Como estava dividido o PDBG?
O PDBG era dividido em duas fases, a Fase I foi praticamente concluída, faltando contudo grande parte do sistema condutor de esgotos a cargo do Estado.
As duas fases se dividiam em componentes, conforme descrito a seguir:
Na Fase II houve a aprovação técnica pelos órgãos financeiros: Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Japonês para Cooperação Internacional (JBIC). De igual forma, passou por processos de aprovações – foram feitas audiências públicas, mas o projeto não recebeu aval do Governo Federal na época. Sendo assim, não houve a extensão do programa.
Não concordo com a afirmação de que a Fase I não teve êxito. Teve sucesso dentro daquilo que foi programado. De fato, o programa apresentou falhas em algumas sessões sim; como nos resíduos sólidos que não teve suas atividades cumpridas. A educação ambiental avançou muito, mas não se tornou permanente, pela falta das demais fases do programa.
A Fase I do PDBG foi implantada nas escolas, houve uma recuperação de toda organização dos órgãos ambientais (na época FEEMA, pois não existia o INEA). Então, dizer que não teve êxito é uma afirmação que eu discordo.
4 – O que foi desenvolvido durante o período do PDBG?
Todo dinheiro proveniente do apoio internacional foi para a construção de Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs). O único patinho feio do programa foi a Estação de São Gonçalo; única que apresenta um processo de tratamento diferenciado das demais – estação com oxigênio puro. Eu como técnico, nunca entendi essa decisão de colocar oxigênio puro naquela estação, já que havia uma grande disponibilidade de área e exatamente a sua falta é que pode explicar a adoção do oxigênio puro, contudo foi uma decisão fundamentalmente da CEDAE e da Secretaria de Obras.
A ETE de São Gonçalo nunca funcionou corretamente, apenas na etapa de testes. Na verdade, não funciona até hoje. Eu não vejo saída para resolver este problema a não ser trocar o processo; de oxigênio puro para lodos ativados tradicional. Além disso, esta ETE sofre muito com as ações das intempéries.
O Programa de Despoluição da Guanabara, além de construir as ETEs, tinha a contrapartida do Estado de fazer os coletores-tronco para interligar redes aos sistemas. Esta foi outra grande falha do programa.
Corretamente foram construídas as ETEs para em seguida implantarem os coletores-tronco, mas estes não foram não aconteceram, por falha do Estado que não soube gerir os recursos que já estavam programados para isso.
Resumindo, o Estado desorganizou-se no planejamento dessas verbas, com isso ele não conseguiu cumprir o compromisso.
5 – Os jogos olímpicos passaram e com eles a promessa de despoluição da Baía de Guanabara. Como especialista na área de saneamento, como o senhor avalia esse fracasso e qual seria o melhor caminho para este problema?
O fracasso é político. Toda e qualquer ação do governo está acalcada na vontade politica de fazer, o que não aconteceu.
A Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – ABES do Rio de Janeiro, apresentou nos primeiros meses que a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida para sediar os jogos olímpicos, um plano de orientação para a despoluição da Baía de Guanabara com a adoção de gradeamentos e comportas de tempo seco nas saídas dos cursos d’águas afluentes à Baía.
Não houve problema técnico, pois técnicos sabiam resolver, não era problema de valor, pois os custos inerentes eram custos para implantação de grades e comportas de tempo seco e eram pequenos perante o patrimônio que temos.
6 – Quanto tempo seria necessário para efetiva despoluição da Baía de Guanabara?
Imagino que o processo deveria ocorrer em duas fases:
- A primeira com o uso de gradeamentos e captações de tempo seco, estimo um período de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos.
- A segunda com a implantação completa de sistemas de esgotamento sanitário, de 10 (dez) à 15 (quinze) anos.
Fonte de informações: Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS, 2010.
Fontes das Imagens: rioonwatch.org.br / og.infg.com.br